O que aprendi com a partida de minha avó
- Josiane Portela
- 20 de fev. de 2016
- 4 min de leitura

Logo mais, no dia seguinte ao meu 27º aniversário, serão dois meses que minha avó partiu. Ensaiei alguns textos após a sua partida, mas, sempre com os olhos marejados, parei nos primeiros parágrafos. Apesar do muito a dizer, algo me travava. A ausência aperta, sufoca. Hoje, depois de ajudar minha mãe a separar as poucas coisas que ela deixou para doar para uma instituição que cuida de idosas, senti do fundo do meu coração que era o momento de colocar nessa tela branca algumas palavras. Mesmo que as lágrimas rolem... escrever é a minha forma de transmitir aquilo que sinto.
São muitas as lembranças que tenho de minha avó. As tantas tardes durante a minha infância que passei com ela, o gosto da comida de vó que é único. O carinho. Os conselhos. “Você tem mais é que curtir a vida”, dizia ela, que sonhava com tanto, mas pelas limitações da vida pouco pôde realizar. Ela, que divertidamente dizia que “rezava para que eu arranjasse um marido”. E a lembrança mais doce que tenho é quando eu, na época de escola, ajudava ela, analfabeta, a traçar algumas palavras em um caderno de caligrafia e me sentia imensamente orgulhosa por isso. A forma dela retribuir era me dizer que eu tinha talento para ser professora. Graças a Deus pude aproveitar bastante da sua presença durante todo esse tempo. Embora, no final da sua vida, não tenha ficado tão próxima quanto eu deveria e gostaria. Mas o sorriso que ela me dava todas as vezes que me via, é algo que sempre lembrarei.
Ela, sábia como sempre, se esforçou, mesmo com as suas dificuldades, para estar com a família naqueles momentos que ela dizia que seriam os seus últimos. Era a forma dela se despedir. Transmitir e ensinar valiosas lições de amor para cada um de nós. Como fez durante toda a vida.
Escrevo, nesse momento, ao som de "Pais e Filhos". A trilha sonora não poderia ser mais oportuna. Como diria Renato Russo, “é preciso amar as pessoas como não houvesse amanhã. Porque, se você parar para pensar, na verdade não há”. É preciso valorizar, fazer tudo o que podemos por quem amamos já, agora, afinal, quando se adia, é bem provável que seja tarde demais.
E, baseada nisso, tomo como exemplo, em particular, minha mãe. Uma entre os seis filhos da Dona Maria. Em todos os momentos dos 88 anos da minha querida avó, especialmente nos últimos anos, quando ela mais precisou devido à saúde debilitada, minha mãe estava ali, presente, abdicando muitas vezes da sua própria vida para se dedicar a ela. Por mais difícil que fosse, ela deixava o cansaço de lado e estava ali, sempre carinhosa e paciente. E, tenho certeza, que minha vózinha partiu grata por tudo que ela fez.
Acho que umas das valiosas lições e exemplo que os pais podem nos deixar é a dedicação deles com os seus próprios pais, nossos avós. A forma como a minha mãe cuidou de minha avó é algo que me marcou para sempre. E é algo que eu, no futuro, com certeza tomarei como exemplo caso minha mãe precise de cuidados e suporte como a minha avó precisou. Quero que minha mãe receba de mim o mesmo amor que ela ofereceu à minha avó durante todo esse tempo. O que ela fez é a forma mais pura e linda de retribuir todo o amor e carinho de minha avó durante toda a vida.
Acredito que todos aqueles que são pais sabem que são espelhos para seus filhos, mesmo que muitas vezes sejam descuidados com os exemplos que passam. E, se tem algo que levo como importante bagagem dessa minha vivência e permito-me oferecer como conselho aos atuais ou futuros pais, é que tratem seus próprios pais como gostariam de ser tratados pelos seus filhos no futuro. Amor e dedicação são retribuídos na mesma medida. Certamente, uma criança, que como eu, cresce e vivencia uma relação de reciprocidade dos pais com os avós, certamente fará o mesmo quando você, pai ou mãe, chegar à velhice.
Quando entrei no Lar de Idosas que receberam as coisas de minha avó, me doeu saber que há idosas ali que foram abandonadas pela família e que provavelmente não tiveram a oportunidade de receber de seus filhos a dedicação que mereciam. Que, possivelmente, não receberam o carinho que minha avó recebeu de seus filhos, netos e bisnetos durante a sua passagem por aqui. Ao menos, fico feliz que minha avó cumpriu sua missão e pôde ser amada por todos nós.
Eles, nossos pais, nos colocaram no mundo, zelaram e cuidaram de nós por muitos anos. No final da vida deles, nada mais justo que recebam em troca tudo o que fizeram por nós. A vida é passageira, o que fica não é o material. São lições e sabedoria que eles nos deixam.
Obrigada, vózinha, por ser tão especial em minha vida e me deixar uma herança tão profunda, que não é material, e sim uma lição de amor. E obrigada, mãe, por ser uma pessoa excepcional, por tudo que fez por ela e por me passar, dia a dia, exemplos que me fazem querer ser uma pessoa tão linda quanto você é.
Comentarios