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A arte do desapego – Quando o acúmulo (físico ou emocional) te sufoca

  • josiaportela
  • 16 de jul. de 2014
  • 3 min de leitura

No auge dos meus 25 anos, praticamente nunca passei por uma mudança de casa na vida, exceto quando mal me entendia por gente. Chegou, então, a hora de juntar minha trouxinha para seguir minha “carreira solo” e ser “dona de casa”. Começar uma nova “saga”.

Eis que me encontro constantemente revirando décadas de coisas acumuladas para decidir o que será encaixotado para seguir comigo e o que vai definitivamente para o lixo. Além de confirmar o quão chato pode ser esse processo, pude sentir na pele que o processo de desapego não é nada fácil.

Entre mexer e remexer aqui e ali em partes que compõe meu canto, minha vida e meu passado, gradativamente vem à tona uma infinidade de coisas. Não só materiais, como sentimentais e emocionais. Nos cadernos antigos, meus sentimentos confusos, declarações de amor nunca enviadas e retratos de diversas fases por quais passei. Entre tantos outros detalhes perdidos em fundos de gavetas. Muitas coisas me fazem rir, algumas trazem boas lembranças, sem esquecer aquelas que hoje parecem uma tremenda bobagem.

Nas caixas, lembranças, cartinhas e mensagens carinhosas... muitas vezes de pessoas que sequer sei o paradeiro hoje, mas insisto em guardá-las pelo sorriso que me tiram nos esporádicos encontros. Entre elas, dediquei um tempo especial para reler a mensagem de consolo da mãe quando não passei em um vestibular concorrido e achei o fim do mundo. O que parecia que não teria fim, hoje me parece uma das melhores coisas que me aconteceram.

Reencontros como esse, que te colocam em contato com fragmentos do seu passado, te mostram como você chegou até o momento presente, o que você viveu, sentiu e sobreviveu. Hoje, vendo tudo isso, a conclusão é que tudo é passageiro, lembranças e sentimentos do passado tornam-se mais leves ou inexistentes. As dores diminuem, amores (reais ou quase platônicos) chegam ao fim, fases acabam, novas recomeçam.

Conclui, então, que esse acúmulo de coisas materiais é um espelho do que acontece com nossos sentimentos. Assim como amontoamos coisas que não usamos nos últimos seis meses, 1, 5, 10 anos - e tampouco usaremos nos próximos - fazemos com sentimentos, lembranças do passado, mágoas, traumas e coisas mal resolvidas. Deixamos todas ali, em um canto empoeirado, armazenadas ao longo do tempo. Sem saber para que ou por quê.

Não nos desfazemos por sermos saudosistas demais para isso, por medo de perdê-las, ou ainda apegamos à hipótese remota do “e se”. E se eu precisar disso um dia? Esse dia em 90% dos casos nunca chega.

Inevitavelmente, assim como itens materiais, sentimentos vão se acumulando, ocupando espaços desnecessários até se tornarem nada mais que incômodo. Em algum momento eles “transbordam”.

Diante do início de uma nova fase que não me permite, até por limitação de espaço, levar comigo tudo o que tenho hoje, é necessário o desapego de muitas coisas físicas. Mas, não só elas, sentimentos também. O empoeirado e inútil acúmulo físico ou sentimental não combina com o novo. É parte do ciclo de vida de qualquer ser da face da Terra.

O que foi bom serve de lembrete de momentos bem vividos. Cabe a nossa decisão de mantê-las somente como memórias que nos alegrará a cada novo reencontro, deixando de lado o resistente desejo de revivê-las em oposição à necessidade de dar novos passos.

Muitos acúmulos são inutilidades que nos impedem de seguir livremente nosso caminho. Sejam elas caixas de tranqueiras ou traumas, mágoas ou receios do passado que seguem latentes atrapalhando e atormentando o presente.

É inevitável a hora de nos despedirmos, colocarmos tudo numa caixa qualquer, sem olhar para trás. O que for inútil, sem dó ou desgosto, deve seguir direto para onde deveria estar há muito: no fundo do lixo. E assim liberar espaço para o novo, porém, possivelmente também temporário. Útil até a próxima mudança.

Em caso de dúvidas do que desapegar, serve a premissa que me disseram em alguns momentos: se está sem uso há mais de seis meses, não merece ser armazenado. Lembrete: válido também ao acúmulo emocional e sentimental. Sentimentos "mortos" por tanto tempo não merecem ser revividos. Sentimentos negativos ativos pelo mesmo tempo, esses sim, também devem ser apagados.

Enquanto finalizo esse texto, duas caixas me aguardam: uma para as coisas materiais, outra para sentimentos guardados em algum lugar desse meu ser. Olho para trás para ver o que irá preenchê-las. Mais cedo ou mais tarde consigo completá-las e me desfazer...

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Josiane, jornalista, profissional de marketing, fotógrafa, com uma aspiração por ser escritora e um quê de quem gosta de filosofar sobre tudo. (saiba mais aqui)

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